A jornalista britânica Helen Russell havia alcançado o que considerava o seu projeto de felicidade: tinha um bom emprego e carreira de sucesso como editora-chefe da revista Marie Claire on-line, na Inglaterra, apartamento agradável, marido querido, bons amigos e um cachorro. Escrevia sobre moda, comportamento, beleza e bem-estar.

Já fazia isso durante 12 anos, até que o marido recebeu uma proposta de trabalho na matriz da Lego, na cidade de Billund, interior da Dinamarca. A oferta era tentadora e o casal viu nessa oportunidade uma provocação do destino que merecia ser considerada. Depois de pesar bem os prós e os contras da decisão, eles resolveram encarar o desafio.

A mudança não foi só de lugar e de trabalho. Helen descreve no livro “O segredo da Dinamarca” (LeYa, 2016) o quanto se permitir vivenciar outro estilo de vida alterou seu modelo mental, tipificado por ela mesma como patricinha ansiosa, vitoriosa e exausta. Os relatos da autora seguem uma cronologia de choque cultural e existencial. A vida que pensava que queria perdeu o sentido diante da combinação que os dinamarqueses fazem entre paixões pessoais, profissão e sentimento de comunidade.

A realização profissional não é sacrificada por dinheiro na Dinamarca. Helen ficou espantada com esse tipo de gente que não escolhe a profissão pelo dinheiro que vai ganhar. E, para completar o espanto, todos os tipos de trabalho são respeitados. Ninguém se acha melhor do que os outros e todo saber e conhecimento é levado em conta como importante para o todo da sociedade.

A Dinamarca é o país com a menor diferença entre os que são muito ricos e os que são muito pobres. A hierarquia social não é algo importante. Lá, as pessoas não procuram pertencer a grupos por distinção social. O país tem milhares de clubes, associações, sociedades e entidades que reúnem as pessoas não por classe, mas por interesses desportivos, sociais, políticos e culturais.

Helen Russell conta da sua perplexidade. A ausência de barulho onde mora é enlouquecedora. Até o cachorro só consegue ficar quieto quando a máquina de lavar está ligada. Nas empresas, os funcionários que ficam após o expediente são considerados incompetentes, e a mulher dinamarquesa se sente honrada quando é vista como forte. Ela fica estupefata por não ver, nem na capital Copenhagen, mulheres esquálidas com aparência de heroína chique.

Os dinamarqueses deram um salto da vida agrícola e da pesca para o de sociedade avançada em pesquisa de ponta, assistência médica de alta tecnologia, educação exemplar e design, com a implantação da política de bem-estar social depois da Segunda Guerra Mundial, quando foram ocupados pela Alemanha nazista. São vikings brigões, vão direto ao assunto, gostam de beber e, como toda sociedade, têm seus defeitos, mas descobriram que a liberdade está na confiança estabelecida pela cultura e organizada pela educação.

Depois de um ano vivendo o estilo dinamarquês, Helen, que não conseguia engravidar, apesar de tantos tratamentos de fertilidade que havia feito em Londres, agora é mãe. E o melhor, está criando o filho em um país que tem um modelo de educação infantil baseado no brincar, alto índice de confiança das pessoas umas nas outras e nas instituições, bem-estar de segurança e senso de corresponsabilidade coletiva.