Comparar as manifestações em defesa do desgoverno instalado no poder republicano (dia 26/5) com os protestos em favor da educação e das instituições de ensino (dia 30/05), como andam fazendo alguns analistas, é prestar um desserviço à democracia. O fato de ambas terem ocorrido nas ruas não caracteriza situações conceitualmente relacionáveis. Medir vigor de eventos com naturezas distintas mostra o quanto a política tem sido tratada como se fosse atração de programa de auditório.

Em tempo de superficialidades nas sensações diárias, concordar é uma atitude percebida como solução. Nesse cenário, nada existe de mais opaco do que a falsa transparência do ativismo da violência e do improviso e seus escretes de comédia, suspense e drama. O pior é que os clichês emitidos pela indigestão pública, a exemplo do termo “balbúrdia”, viram palavras de ordem na insuficiente resistência, tornando-se combustível para a máquina de propaganda que pretende combater.

O comportamento social está orientado por uma certeza prática desumanizante, produzindo crenças injustas no senso comum e abrindo espaço para a ação dos que querem se beneficiar da convulsão de uma sociedade dividida. A crença na sobrevivência é diferente da crença por justiça e liberdade porque uma está associada à necessidade e a outra ao desejo. É o que temos, e não o que somos. Manifestações como as que estão sendo feitas em favor da educação, além de aglutinadoras, têm o poder de reacender o interesse político da juventude.

Depois do governo oligarca de José Sarney (1985 a 1990), na transição da ditadura para o início do processo democrático, desde 1989 a experiência de escolha de presidentes pelo povo brasileiro é bem curiosa: a população elegeu o empresário Fernando Collor de Mello (1990 – 1992), o intelectual Fernando Henrique Cardoso (1995 – 2003), o trabalhador Luís Inácio Lula da Silva (2003 – 2011), a revolucionária Dilma Rousseff (2011 – 2016) e o militar Jair Bolsonaro (2019 – ????). São 30 anos de variadas tentativas de preferências ao sabor dos algoritmos da escuridão.

O maior problema na superação da atual crise brasileira é que muita gente só acredita no que não está vendo. As pessoas em geral acabam sendo tragadas por unanimidades rivais que se retroalimentam em ambiguidades morais, unidas no que pode provocar a destruição da liberdade do pensamento, tornando os intelectuais desnecessários até para o triste papel de animadores de jantares. O que seria virtude vira vício quando se negam corresponsabilidades diante dos fatos. As ideias-fixas dominam o sentido da participação em um mainstream da insanidade.

Parece que todos queremos converter nossos interlocutores, mas não admitimos a possibilidade de rever o que fazemos fora do discurso. Só há graça nas preferências exclusivas. Estamos perdendo a mutualidade. Sobram palavras incendiárias e faltam fogueiras para, enquanto coletividade, nos encontrarmos ao redor do fogo. A retração nas relações culturais é um estímulo à prática comum da delinquência e à ampliação da hipocrisia. Na contração da cultura, expandem-se as leis como maneira de forçar os que discordam a aceitar crenças e convicções muitas vezes atreladas a propósitos ocultos, no tempo em que se discute qual a manifestação maior.