Jornal O Estado do Paraná – Almanaque, pág. 05 
Curitiba, domingo, 23 de outubro de 1994


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Nas ondas sonoras do Ceará não viajam só Belchior, ednardo ou Fagner. Há outras vozes e compositores, como o selo Camerati vem demonstrar no CD “Rolimã”, lançado em julho e que vem acontecer também no Sul. O disco reúne treze intérpretes em torno das composições de Flávio Paiva e seus parceiros.

Gravado em Fortaleza, mixado no estúdio da Camerati (gravadora paulistana criada há três anos, e já detentora de um catálogo de primeira dedicado à música brasileira contemporânea), masterizado nos Estados Unidos e manufaturado no Canadá, “Rolimã” prima pela produção também na parte gráfica, trazendo um minilivro em policromia com as letras e fotos dos intérpretes. Sinal de que alternativo não é sinônimo de descuido.

Flávio Paiva, jornalista por profissão, compõe desde 1985, sem preferência por gênero ou estilo. Do rock ao baião, comportam também balada, samba e até canção de ninar, com espaço para forró e balanceio sanfonado ao lado de bumba-meu-boi. Afinal, o CD é um apanhado de seu trabalho até 93, com um total de doze canções. Deslizam nesse rolimã André Vidal, Aparecida Silvino, Armando Telles, Calé Alencar, Cristiano Pinho, Edmar Gonçalves, Eugênio Leandro, Eugênio Matos, Falcão, João Monteiro, Kátia Freitas, Manuel Gonzáles, Marta Aurélia, Mona Gadelha, Norberta Viana, Olga Ribeiro, Paula Tesser, Ricardo Black, Tarcísio José de Lima, Tarcísio Matos, Tarcísio Sardinha e Valdo Aderaldo.

O resultado é um quitute de bom sabor. Amargo é o desabafo de Flávio Paiva a propósito da conduta do Pessoal do Ceará.

“Quando pararam de surpreender, enquanto compositores e intérpretes nacionais, Ednardo, Belchior e Fagner detonaram um spray paralisante no relacionamento com os que vieram depois deles. Conduzidos pelo instinto de proteção, cada qual atracou o seu galho e ninguém lembrou de descer para irrigar a horta. Foi desertificação geral. Cortaram madeira de árvores caídas, burocratizaram o cotidiano e domesticaram talentos no melhor estilo rodriguiano do “perdoa-me por me traíres”. Sozinhos como referência cearense, eles passaram a ter uma certa satisfação sadomasoquista de serem apenas três.

Divididos entre si, mas três. Dá uma certa tranqüilidade. Se não acontecer mais nada na música do Ceará, estarão, mesmo assim, nos compêndios, nas antologias, não aparecendo mais ninguém, então, maravilha, ficarão livres de comparações.”