Jornal Diário do Nordeste – Estilo de vida, cultura e lazer
Fortaleza, 01/09/1994

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Diz o ditado que em terra de cego, quem tem um olho é rei. Em terra brasilis, quem não se vira em diversas atividades não sobrevive. Seja por necessidade ou por prazer, o brasileiro é versátil por natureza. Flávio Paiva não é diferente. É jornalista, poeta, editor, compositor, produtor, entre outras atividades. Sua mais recente “danação” está chegando ao mercado sob o formato do compact-disc “Rolimã – Flávio Paiva em parcerias” que tem lançamento nacional pelo selo paulista Camerati – que pertence ao músico Cláudio Lucci (não confundir com o ex-Boca Livre Cláudio Nucci).

Pra não fugir à regra, até a ilustração da capa é obra de Flávio. “Rolimã” registra seu lado de compositor, mostrando também a diversidade dos parceiros que vão do brega-star Falcão à cantora Kátia Freitas, o cantor/compositor Calé Alencar, sem falar na profusão de Tarcísios – o jornalista/cronista Tarcísio Matos, o guitarrista Tarcísio Sardinha e o músico e pesquisar Tarcísio José de Lima – entre outros. Como entre as atividades de Flávio, a de cantor não entrou (ainda), “Rolimã” traz um verdadeiro “quem é quem” da cena cearense. Cada uma das 12 faixas do CD traz intérpretes diferentes.

Flávio lembra que a música já integra seu universo de atividades desde os tempos que ainda morava em Independência, sua cidade natal no interior do Estado. Lembra com bom humor que chegou a integrar um trio cover dos Secos & Molhados na sua cidade por volta de 1974. Já em Fortaleza, Flávio Paiva participou das primeiras formações do coral da Escola Técnica Federal, quando tinha à frente o castrati Paulo Abel do Nascimento como regente. Isso foi em 1977. Dois anos depois, ele fundou a Cooperativa de Compositores e Poetas ao lado de nomes novos na época como Mona Gadelha, Bernardo Neto e Falcão.

“Procurar um selo é uma necessidade dos artistas. Nós já merecemos algo assim, mais profissional, que não seja ficar esmolando gentilezas da Secretaria de Cultura do Estado ou do Município, para lançar o nosso trabalho (…) Este é o primeiro disco de um artista radicado no Nordeste pelo selo Camerati – que vem editando discos de Arrigo Barnabé, Tetê Espíndola e Duofel”

“Não sou um compositor profissional. Todas as minhas músicas existem porque houve um motivo que me levou a fazê-la.”, explica. Seu lado musical mais conhecido pode ser ouvido nos discos do brega-star Falcão, quando geralmente assina Flávio D’Independência – pseudônimo que usa desde os tempos do jornal independente Sem Regras – e com o qual ficou conhecido nos meios da imprensa alternativa de todo o País. Sua primeira produção a chegar ao disco foi o álbum-projeto “América”, protagonizado pela cantora cearense Olga Ribeiro, em 92 – ano que marcou o aniversário de 500 anos de descoberta do Continente Americano. O disco chegou a ser mostrado na Rio Eco-92.

“Gosto de esclarecer um pouco desse histórico para mostrar que a música não é um universo estranho para mim, pelo contrário”, afirma. Depois de encerrada a produção de “América” e com o aval que o projeto lhe deu, Flávio pensou num vôo mais alto. Aí começa a se esboçar a idéia do CD “Rolimã”. Quando resolvi gravar o disco, fui procurar as composições que já tinha feito”, disse. Foi um trabalho do tipo vasculhar as gavetas e arquivos próprios. Flávio disse que se surpreendeu com o grande número de composições que havia acumulado durante esses anos.

No processo de escolha, sobraram cerca de 30 composições. Somente 15 chegaram a ser gravadas em estúdio e 12 faixas foi o resultado final do projeto “Rolimã – Flávio Paiva em parcerias”. “São músicas em gêneros diversos. Queria fazer o disco como uma coletânea de poemas e contos. Cada música tem a sua história, sua razão de ser, por que aquele intérprete foi escolhido”, disse. Um exemplo disso é a faixa “Flávio & Andréa” – um poema do próprio Flávio musicado pelo músico Eugênio Matos. A música substituiu a tradicional “Marcha nupcial” no próprio casamento do autor. A mesma Aparecida Silvino que cantou no disco, interpretou a música na cerimônia. Música e intérprete ganharam elogios de todos presentes.

Nos créditos do CD “Rolimã”, Flávio Paiva trouxe de volta o hábito antigo de colocar uma referência ao gênero de música logo após seu título, só que a sua maneira – acrescentando um comentário próprio do tipo “cantiga de ternura” no caso da citada “Flávio & Andréa”. Outra coisa importante é a numeração dos exemplares do CD. “É uma coisa que é importante para o nosso próprio controle, como para direito autoral”, informa.

O lançamento feito pela Camerati, segundo Flávio, é uma porta aberta para a produção musical cearense entrar na onda dos selos independentes que vem abrindo espaço para compositores novos e nomes que não encontram espaço na mídia nacional. “Procurar um selo é uma necessidade dos artistas. Nós já merecemos algo assim que não seja ficar esmolando gentilezas do estado ou do município para lançar as produções locais”, afirma. É praticamente o primeiro lançamento de artista radicado no Nordeste pelo selo Camerati – que vem editando discos de Arrigo Barnabé, Tetê Espíndola, Duofel, entre outros. “É uma porta aberta para os artistas cearenses”, disse.