Um ano antes da declaração da independência do Brasil em 1822, o rei dom João VI, percebendo que seu filho, o príncipe dom Pedro, entregaria o aparato estatal à elite agrária da colônia, enviou um exército à província piauiense, com a finalidade de preservar para Portugal os territórios do Piauí, Maranhão e Grão-Pará, este último constituído pelo que viriam a ser os atuais estados do Pará, Amazônia, Amapá, Roraima e Rondônia.

O domínio português era pleno nessas áreas do Norte, cujas autoridades seguiam fielmente todas as ordens e instruções régias. O que a Metrópole não esperava era que cearenses, piauienses e maranhenses, providos apenas de armas de caça e instrumentos de trabalho no campo, formariam uma Legião Popular capaz de inviabilizar a missão das bem-equipadas e qualificadas tropas lusitanas.

A Batalha do Jenipapo, ocorrida em Santo Antônio do Surubim, hoje Campo Maior (PI), no dia 13 de março de 1823, foi o confronto mais sangrento dessa jornada. Sobre esse acontecimento, está sendo realizado no auditório do 2º BEC, em Teresina (dias 14 e 15), o “Seminário Nacional Comemorativo dos 200 Anos da Independência do Brasil na Província do Piauhy”, também com transmissão on-line e visitas (dias 13 e 16) a sítios históricos vinculados ao tema.

Em Cachias das Aldeias Altas, hoje Caxias (MA), aconteceu entre maio e julho de 1823 o grande cerco ao quartel do Morro das Tabocas (hoje Morro do Alecrim, em homenagem a João da Costa Alecrim, o líder popular da resistência) encerrado com a captura do major Fidié, comandante das forças militares portuguesas. Com essa derrota, a Corte perdeu força e o Brasil manteve a Amazônia no seu mapa.

A Academia Caxiense de Letras e a Academia Sertaneja de Letras, Educação e Artes do Maranhão têm realizado palestras sobre o assunto, mas o município focará suas comemorações no dia primeiro de agosto, data da Adesão de Caxias à Independência. Durante o ano, essas celebrações serão combinadas ainda com o bicentenário do poeta Gonçalves Dias (1823 – 2023), caxiense nascido no sítio Boa Vista, na mata do Jatobá.

Arte de Ana Mendina.

Todos esses fatos históricos são muito importantes, mas eles teriam muito mais amplitude nacional e internacional se fossem tratados de forma conjunta. Percebi isso ao investigar as razões que levaram o nome do lugar onde nasci (antes Piauí e hoje Ceará) a chamar-se Independência. Nossos antepassados dos Inhamuns, da Ibiapaba, do Meio Norte e da Mata dos Cocais lutaram lado a lado e deram essa grande contribuição ao país.

Essa saga precisa ser tratada com a grandeza com que se aborda a luta dos soldados-seringueiros-cearenses que, em 1902, liderados pelo gaúcho Plácido de Castro, impediram que os Estados Unidos criassem um enclave na América do Sul através da Bolivian Syndicate, companhia administrada por banqueiros ingleses e estadunidenses, com poderes de explorar as riquezas do Acre e militarizar a região.

Escrevi o livro “Toque de Avançar. Destino: Independência” (Armazém da Cultura) também por motivação específica, é certo, porém descobri nesse percurso que não é só o evento da Independência que nos vincula nesses episódios; sem o enfrentamento das forças terrestres de ocupação pela brava defesa sertaneja, o território brasileiro seria apenas a faixa que se estende do Ceará para baixo. Não teria nada de Amazônia.

Tendo como vórtice o evento definidor dessa jornada épica, participarei, ao lado do historiador Francisco Pinheiro, do debate “200 anos do Cerco a Cachias – A vitória de cearenses, piauienses e maranhenses que assegurou a Amazônia para o Brasil”, às 10 horas do dia 21/03, no auditório do Departamento de História da UFC, em Fortaleza.

Fonte
https://mais.opovo.com.br/colunistas/flavio-paiva/2023/03/13/200-anos-da-amazonia-brasileira.html