Projeto é resultado de um esforço coletivo, envolvendo nomes como Daniel Groove e Daniel Medina

Por Diego Barbosa – Repórter

A performer e poeta cearense ILYA: experimentalismo e diversidade sonora marcam o primeiro disco. (Foto: Caroline Sousa)

Autodefinida como alguém que “ama a pluralidade, o produzir em coletivo e de agregar coisas que resultem em algo diferente ao que foi inicialmente pensado”, a performer e poeta cearense Ilya executa um movimento artístico que transparece polifonia, encontro de identidades. Muito disso é resultado de um desbravar atento pela cidade, que empreendeu visando descobrir pessoas, sons e novos olhares sobre si e os outros.

“Desde que nasci, da minha formação enquanto gente, tudo mudou muito em Fortaleza. Venho de uma família de classe média e, ao me permitir sair da bolha de uma parte favorecida na cidade, fui navegar em outros mares, me libertando de paradigmas que geralmente nos acompanham quando ficamos apenas em prédios”, conta, dimensionando que o que conheceu para além da fresta das janelas tornou-se combustível para as empreitadas profissionais que fez adiante.

Entre elas, constam a participação no grupo Tripulantes da Sabiabarca, onde uniu-se a Carlos Hardy e Diego Ramires (in memoriam); a formação da dupla eletrônica Mantra Coité, com DJ Motor; interpretação de canção gravada com Chico César para o livro-CD “Bulbrax – Sociomorfologia Cultural de Fortaleza”, do escritor Flávio Paiva; e, no ano passado, integrou o bloco carnavalesco As Gata Pira.

Seu projeto mais recente é o disco “Doces náufragos” – primeiro trabalho-solo da artista, disponível apenas nas plataformas digitais no momento – cujo lançamento acontece neste domingo (23), às 19h, na Sala Itaú Cultural, em São Paulo.

Fortaleza, se fosse traduzida em trilha sonora, certamente herdaria a textura rítmica que o disco carrega, evocando ambientes, paisagens e realidades cuja diversidade é sobressalente. Não à toa, Ilya conta que o CD é uma homenagem à Capital, uma forma de registrar “os encontros na cidade”.

Travessia
Com o mote definido, a sonoridade que a artista propõe é de travessia pelas próprias composições e de um intercâmbio com a cena contemporânea de músicos da terra, fazendo prevalecer um engajamento criativo intenso. Entre os que chegaram junto para fazer valer o trabalho, estão os cearenses Daniel Groove e Daniel Medina (que assina também a produção musical do álbum, com Ilya e Cláudio Mendes), José Rodrigues (PE/CE), Michele Tajra (PI/CE) e Maria Ó (SP).

Klaus Sena foi responsável pela gravação do material em Fortaleza, no estúdio Magnólia; por sua vez, em solo paulistano, as vozes e overdubs gravados foram realizados na Índigo Azul – que abriga o selo, estúdio e produtora cultural homônimos – e contaram com a presença de Igor Caracas e Soledad. Estes últimos também marcarão presença no show de lançamento, com os músicos cearenses Cláudio Mendes, Rian Batista e Beto Gibb, além do guitarrista Vitor Colares.

Ilya destaca que, além da satisfatória estrutura disponibilizada pelo Itaú Cultural, a apresentação será beneficiada pela equipe técnica à frente do projeto. Além dos parceiros já citados, Lu Grecco assina a cenografia, Danila Moura fica a cargo da iluminação e os figurinos usados pela artista serão da Casa Pindorô, brechó localizado em São Paulo.

“É um esforço para deixar tudo com o conceito que acompanha o álbum”, explica a cantora e compositora. “O disco vem sendo pensado desde 2014 e iniciamos este ano com o plano de lançá-lo, amadurecendo continuamente a ideia até chegar ao resultado final”.

Pop
“Doces náufragos” elege o pop como gênero-âncora para dar o tom de cada uma das nove canções que o integram. O pontapé inicial do disco é com “Sereno doido”, apostando em uma batida animada de pop-rock para bradar mensagens como “contramão é ser feliz na chuva”. Na sequência, “Salão das ilusões”, “Nada” e “Cidade pequena” investem em instrumentos percussivos para igualmente bradar brasilidade.

O ponto alto acontece com “Canções de mar”, composta pelo pernambucano José Rodrigues. A música tem um significado especial para Ilya, pois foi a partir dela que se iniciou seu processo de se lançar nos palcos como artista-solo. Também foi uma das molas propulsoras para a gravação deste seu primeiro trabalho, refletindo a vitalidade do mesmo.

A faixa, inclusive, foi uma das que ganharam videoclipe, dirigido e encenado pela própria artista e editado por Igor Cândido, lançado no anfiteatro do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura (CDMAC) em janeiro deste ano, no festival Férias no Dragão. Com ela, “Se eu saio e você dança” e “Balneabilidade livre” também ganharam clipes, o primeiro com produção musical de Yuri Kalil e o segundo dirigido por um time composto por Clara Capelo, Monstra, Themis Memória e Ilya.

Mediante o estreitamento dessas conexões com a turma de cá, a performer avalia o cenário artístico no Ceará de modo otimista. “Acho que estamos bem abertos e disponíveis para caminhar juntos. Já faz um tempo que rola uma atenção nacional nos trabalhos desenvolvidos por aqui e fico muito feliz de estar nesse meio”, comemora.

“Ao mesmo tempo, observo que, apesar de haver uma força-tarefa dos artistas locais para que as criações sejam exportadas, eles continuam na cidade, o que é muito bacana”, completa, citando nomes como Getúlio Abelha e Lorena Nunes como alguns dos mais representativos na seara musical do Estado hoje.

Por ora, Ilya quer colher os frutos que o lançamento do disco em São Paulo deve favorecer. E adianta que deve se apresentar em Fortaleza até o fim deste ano ou início do próximo. É esperar para conferir.

Mais informações
Lançamento do CD “Doces náufragos”, de Ilya. Neste domingo (23), às 19h, no Itaú Cultural (Av. Paulista, 149, Bela Vista, São Paulo). Entrada franca. Contato: (11) 2168-1777.

Ouça o disco na íntegra: