Foi a bailarina e gestora cultural sul-mato-grossense Márcia Rolon que me perguntou, para o livro Código Aberto, como percebo e ajo ao sentir que há conectividade divina com o meu processo criativo.

Contei que certa vez, em conversa com o bailarino alemão Rolf Gelewski (1930 – 1988), relatei a sensação de contentamento que tenho quando ofereço algo de mim que pode tocar a sensibilidade de outras pessoas.

Ele me falou que isso acontecia porque eu unia a sinceridade do esforço com a alegria de alcançar algo em pleno fluxo, mas sem a cobrança de criar pensando no resultado, pois o resultado não nos pertence.

A conectividade com Deus se dá nesse trajeto dentro de si por uma necessidade imperiosa do próprio esforço, que não é nada mais, nada menos do que a dádiva que oferecemos à consciência divina em nós e no universo.

O ato espontâneo, sem a expectativa de controle do resultado, é o que mais se aproxima de mim e do caráter do que produzo. Viver em paz não se limita a uma condição absoluta da vontade, mas a muitas maneiras de agradecer.

O processo verificável de descobertas, experimentações e elevação espiritual da humanidade, no qual a manifestação volitiva proporciona a iluminação divina, é o segredo da invencibilidade da esperança.

Sou um fã ardoroso da raça humana e um admirador do processo evolutivo das civilizações. Penso apenas que, nos tempos atuais, amar a diversidade deveria ser a motivação primeira das buscas sociais, culturais e transcendentais.

O acesso a Deus deveria partir de nossas dúvidas, curiosidades e necessidades de harmonia entre o viver, a gestão da vida e a deificação estética. Deus é a poesia do eu-profundo.

Deus é ecumênico. E o prazer de senti-Lo precisa ser mais forte do que qualquer argumentação racional sobre a Sua existência. Para isso as religiões deveriam exaltar mais sentimentos libertários do que preceitos dogmáticos.

Estaremos mais bem preparados para a alegria do divino na arte e na literatura quando, diante de uma bela flor, não mais dissermos que parece de plástico, como forma de exultar a sua beleza.

A presença do Deus amoroso está em muitos dos lugares por onde passamos e em tudo o que fazemos, desde que estejamos atentos às manifestações espontâneas das camadas que integram o composto essencial do ser pessoa.

A inteligência humana tem um certo domínio de todas as outras camadas de realidade: a física, que pode ser tocada e modificada; a simbólica, onde se dá a ação dos signos; a imaginária, que funciona como campo de liberdade plena; e a dos sonhos, que atua como desfragmentadora da mente.

Onde quer que nos encontremos, um ambiente de purificação pode ser criado pelo amor ao que somos e ao que fazemos, como agradecimento à vida, a arte, a literatura e aos mistérios divinos, sempre dentro e fora de cada um e de todos nós.

Fonte: Rivista do Mino